sexta-feira, 12 de outubro de 2007

A guerra fria continua - primeira parte

No dia 02 de Agosto de 2006 ...

A guerra fria ainda não acabou. A América latina vive ainda hoje, e de forma raivosa, sob os efeitos de uma guerra dissimulada, sórdida e acobertada pelo monopólio das comunicações.
Desde de 1959 a autodeterminação do povo cubano optou por um país livre das amarras do imperialismo estadunidense que transformava aquela ilha num quintal dos interesses dos EUA. A Revolução de Fidel, Raúl, Che, Camilo e do povo cubano, fez de Cuba um território de resistência, e o medo da “cubanização” do restante da América Latina, justificou invasões militares como em Granada, El Salvador, Nicarágua, e ainda patrocinou ditaduras militares como na Argentina, no Chile, no Brasil...E o que vemos hoje, tal como ontem, é a tentativa de se inverter a dicotomia liberdade Vs tirania.
Nesse 1º de Agosto de 2006 o comandante em chefe Fidel Castro Ruz se licenciou de suas tarefas no comando de Cuba, para fazer às pressas uma cirurgia.
E foi tudo o que precisavam os canais de informação de massa do mundo ocidental. Mostraram a “fragilidade” do Presidente cubano quando levou um tombo em 2003, a “debilidade” de sua saúde quando num discurso em 2002 na praça da revolução quase desmaiou. Mas nada foi mais patético que a festa dos cubanitos de Miami comemorando a “saída” de Fidel temporariamente.
O que poucos veículos colocaram no ar, foi o apoio do povo cubano a Raúl Castro, irmão de Fidel e figura importantíssima na arquitetura ideológica da Revolução de 59 e a solidariedade à Fidel com os votos de regresse logo, pois sabe aquele povo o valor de um processo revolucionário que destruiu um dos tentáculos do neocolonialismo na América latina.
Para nós, expostos ao monopólio da informação de meia dúzia de redes internacionais, vale a reflexão: O que é democracia? O que é ditadura? O que é ser tirano? Qual sistema deve acabar? E comparemos a pequena Cuba com o gigante EUA. Qual dos dois tem um presidente que é sustentado pela indústria bélica? Qual dos dois bate no peito e se orgulha de ter sido o governante que mais matou em seu estado quando fora governador? Qual dos dois invade o Oriente Médio com a empáfia de se auto declarar o paladino da democracia? Qual dos dois patrocinou ditaduras sangrentas na América latina, África e Ásia? Qual dos dois mantém no cargo uma mulher que compara a guerra de Israel contra o Líbano a um “parto necessário para o Oriente Médio”, pois estaria nascendo ali uma nova democracia? Qual dos dois manteve negócios de Petróleo com Osama Bin Laden? Qual dos dois “criou” Sadam Hussein para combater a URSS? Qual dos dois sistemas não só não resolveu o problema da fome como acentuou? Qual dos dois sistemas acredita no consumo como fundamento para o progresso? Qual dos dois sistemas faz da educação pouco acessível a maior parte da população?...
Que Fidel errou nesses anos de governo em Cuba, não duvido. Que Fidel se distanciou do marxismo algumas vezes em nome do isolamento, tampouco. Mas que Cuba ousou dar um passo à frente do restante do planeta, me parece claro.
Por isso, vida longa a Revolução Cubana! Que Fidel volte logo para ver seu povo o apoiando e possa fazer uma transição, ao estilo democrático cubano, e dessa forma, calar mais uma vez a boca de todos que estão a serviço do imperialismo.

quinta-feira, 11 de outubro de 2007

Tropa de Elite: A Criminalização da Pobreza!

Recebi de um amigo este artigo que segue sobre a polêmica instalada no Brasil acerca do filme Tropa de Elite. Muito se discute sobre o tema e vale aqui a contribuição sempre lúcida e dialética do Camarada Ivan Pinheiro,Secretário Geral do PCB (por favor não confundir, com esta coisinha espúria denominada pc do b).
Um bolivariano abraço, JJ e Vozes da América.

TROPA DE ELITE:

A CRIMINALIZAÇÃO DA POBREZA!

(Ivan Pinheiro)

"Homem de preto.
Qual é sua missão?
É invadir favela
E deixar corpo no chão"

(refrão do BOPE)

Não dá cair no papo furado de que "Tropa de Elite" é "arte pura" ou "obra aberta". Um filme sobre questões sociais não podia ser neutro. Trata-se de uma obra de arte objetivamente ideológica, de caráter fascista, que serve à criminalização e ao extermínio da pobreza. É possível até que os diretores subjetivamente não quisessem este resultado, mas apenas ganhar dinheiro, prestígio e, quem sabe, um Oscar. Vão jurar o resto da vida que não são de direita. Aliás, você conhece alguém no Brasil, ainda mais na área cultural, que se diga de direita?

Como acredito mais em conspirações do que no acaso, não descarto a hipótese de o filme ter sido encomendado por setores conservadores. Estou curioso para saber quais foram os mecenas desta caríssima produção, que certamente foi financiada por incentivos fiscais.

O filme tem objetivos diferentes, para públicos diferentes. Para os proletários das comunidades carentes, o objetivo é botar mais medo ainda na "caveira" (o BOPE, os "homens de preto"). O vazamento escancarado das cópias piratas talvez seja, além de uma estratégia de marketing, parte de uma campanha ideológica. A pirataria é a única maneira de o filme ser visto pelos que não podem pagar os caros ingressos dos cinemas. Aliás, que cinemas? Não existe mais um cinema nos subúrbios, a não ser em shopping, que não é lugar de pobre freqüentar, até porque se sente excluído e discriminado.

No filme, os "caveiras" são invencíveis e imortais. O único que morre é porque "deu mole". Cometeu o erro de ir ao morro à paisana, para levar óculos para um menino pobre, em nome de um colega de tropa que estava identificado na área como policial. Resumo: foi fazer uma boa ação e acabou assassinado pelos bandidos.

Para as classes médias e altas, o objetivo do filme é conquistar mais simpatia para o BOPE, na luta dos "de cima", que moram embaixo, contra os "de baixo", que moram encima.

Os "homens de preto" são glamourizados, como abnegados e incorruptíveis. Apesar de bem intencionados e preocupados socialmente, são obrigados a torturar e assassinar a sangue frio, em "nosso nome". Para servir à "nossa sociedade", sacrificam a família, a saúde e os estudos. Nós lhes devemos tudo isso! Portanto, precisam ser impunes. Você já viu algum "caveira" ser processado e julgado por tortura ou assassinato? "Caveira" não tem nome, a não ser no filme. A "Caveira" é uma instituição, impessoal, quase secreta.

Há várias cenas para justificar a tortura como "um mal necessário". Em ambas, o resultado é positivo para os torturadores, ou seja, os torturados não resistem e "cagüetam" os procurados, que são pegos e mortos, com requintes de crueldade. Fica outra mensagem: sem aquelas torturas, o resultado era impossível.

Tudo é feito para nos sentirmos numa verdadeira guerra, do bem contra o mal. É impossível não nos remetermos ao Iraque ou à Palestina: na guerra, quase tudo é permitido. À certa altura, afirma o narrador, orgulhoso : "nem no exército de Israel há soldados iguais aos do BOPE".

Para quem mora no Rio, é ridículo levar a sério as cenas em que os "rangers" sobem os morros, saindo do nada, se esgueirando pelas encostas e ruelas, sem que sejam percebidos pelos olheiros e fogueteiros das gangues do varejo de drogas! Esta manipulação cumpre o papel de torná-los ainda mais invencíveis e, ao mesmo tempo, de esconder o estigmatizado "Caveirão", dentro do qual, na vida real, eles sobem o morro, blindados. O "Caveirão", a maior marca do BOPE, não aparece no filme: os heróis não podem parecer covardes!

O filme procura desqualificar a polêmica ideológica com a esquerda, que responsabiliza as injustiças sociais como causa principal da violência e marginalidade. Para ridicularizar a defesa dos direitos humanos e escamotear a denúncia do capitalismo, os antagonistas da truculência policial são estudantes da PUC, "despojados de boutique", que se dão a alguns luxos, por não terem ainda chegado à maioridade burguesa.

Os protestos contra a violência retratados no filme são performances no estilo "viva rico", em que a burguesia e a pequena-burguesia vão para a orla pedir paz, como se fosse possível acabar com a violência com velas e roupas brancas, ou seja, como se tratasse de um problema moral ou cultural e não social.

A burguesia passa incólume pelo filme, a não ser pela caricatura de seus filhos que, na Faculdade, fumam um baseado e discutem Foucault. Um personagem chamado "Baiano" (sutil preconceito) é a personificação do tráfico de drogas e de armas, como se não passasse de um desses meninos pobres, apenas mais espertos que os outros, que se fazem "Chefe do Morro" e que não chegam aos trinta anos de idade, simples varejistas de drogas e armas, produtos dos mais rentáveis do capitalismo contemporâneo. Nenhuma menção a como as drogas e armas chegam às comunidades, distribuídas pelos grandes traficantes capitalistas, sempre impunes, longe das balas achadas e perdidas. E ainda responsabilizam os consumidores pela existência do tráfico de drogas, como se o sistema não tivesse nada a ver com isso!

O Estado burguês também passa incólume pelo filme. Nenhuma alusão à ausência do Estado nas comunidades carentes, principal causa do domínio do banditismo. Nenhuma denúncia de que lá falta tudo que sobra nos bairros ricos. No filme, corrupção é um soldado da PM tomar um chope de graça, para dar segurança a um bar. Aliás, o filme arrasa impiedosamente os policiais "não caveiras", generalizando-os como corruptos e covardes, principalmente os que ficam multando nossos carros e tolhendo nossas pequenas transgressões, ao invés de subirem o morro para matar bandido.

A grande sacada do filme é que o personagem ideológico principal não é o artista principal. Este, branco, é o que mais mata. Ironicamente, chama-se Nascimento. É um tipo patológico, messiânico, sanguinário, que manda um colega matar enquanto fala ao celular com a mulher sobre o nascimento do filho.

Mas para fazer a cabeça de todos os públicos, tanto os "de cima" como os "de baixo", o grande e verdadeiro herói da trama surge no final: Thiago, um jovem negro, pacato, criado numa comunidade pobre, que foi trabalhar na PM para custear seus estudos de Direito, louco para largar aquela vida e ser advogado. Como PM, foi um peixe fora d'água: incorruptível, respeitava as leis e os cidadãos. Generoso, foi ele quem comprou os óculos para dar para o menino míope. Sua entrada no BOPE não foi por vocação, mas por acaso.

Para ficar claro que não há solução fora da repressão e do extermínio e que não adianta criticar nem fazer passeata, pois "guerra é guerra", nosso novo herói se transforma no mais cruel dos "caveiras" da tropa da elite, a ponto de dar o tiro de misericórdia no varejista "Baiano", depois que este foi torturado, dominado e imobilizado. Para não parecer uma guerra de brancos ricos contra negros pobres, mas do bem contra o mal, o nosso herói é um "caveira" negro, que mata um bandido "baiano", de sua própria classe, num ritual macabro para sinalizar uma possibilidade de "mobilidade social", para usar uma expressão cretina dos entusiastas das "políticas compensatórias".

A fascistização é um fenômeno que vem sendo impulsionado pelo imperialismo em escala mundial. A pretexto da luta contra o terrorismo, criminalizam-se governos, líderes, povos, países, religiões, raças, culturas, ideologias, camadas sociais.

Em qualquer país em que "Tropa de Elite" passar, principalmente nos Estados Unidos e na Europa, o filme estará contribuindo para que a sociedade se torne mais fascista e mais intolerante com os negros, os imigrantes de países periféricos e delinqüentes de baixa renda.

No Brasil, a mídia burguesa há muito tempo trabalha a idéia de que estamos numa verdadeira guerra, fazendo sutilmente a apologia da repressão. Sentimos isso de perto. Quantas vezes já vimos pessoas nas ruas querendo linchar um ladrão amador, pego roubando alguma coisa de alguém? Quantas vezes ouvimos, até de trabalhadores, que "bandido tem que morrer"?

Se não reagirmos, daqui a pouco a classe média vai para as ruas pedir mais BOPE e menos direitos humanos e, de novo, fazer o jogo da burguesia, que quer exterminar os pobres, que só criam problemas e ainda por cima não contam na sociedade de consumo. Daqui a pouco, as milícias particulares vão se espalhar pelo país, inspiradas nos heróicos "homens de preto", num perigoso processo de privatização da segurança pública e da justiça. Não nos esqueçamos do modelo da "matriz": hoje, os mais sanguinários soldados americanos no Iraque são mercenários recrutados por empresas particulares de segurança, não sujeitos a regulamentos e códigos militares.

Parafraseando Bertolt Brecht, depois vai sobrar para nós, que teimamos em lutar contra o fascismo e a barbárie, sonhando com um mundo justo e fraterno.

A trilha sonora do filme já avisou:

"Tropa de Elite,
Osso duro de roer,
Pega um, pega geral.
Também vai pegar você!"



(Ivan Pinheiro)