domingo, 15 de junho de 2008

José Bispo Clementino dos Santos

O sábado não amanheceu no pomar do samba. Fruta doce e ácida, como a personalidade de seu xará, Jamelão foi um dos frutos mais nobres da Mangueira que não só dá manga.
Morreu ontem de falência múltipla dos órgãos o homem por trás da voz que embalou parte da história de uma das mais tradicionais escolas de samba do Brasil. Jamelão imortalizou suas interpretações mas constatou que ninguém consegue fugir da inevitabilidade do tempo e, agora, virou adubo para outros talentos não deixarem morrer de falência múltipla cultural nossa já tão combalida saúde musical.
Queria acreditar que esta noite tem roda de samba no céu. Num exercício de pura transgressão aos meus princípios, consigo ver uma grande mesa sorrir. Lá está Pixinguinha com seu olhar terno e seu pulmão a serviço do sopro entoando um solo enquanto todos se levantam em homenagem ao mais novo membro da equipe celestial do samba. Também vejo compositores imortais como Nelson Sargento, Silas de Oliveira, Cartola, Noel Rosa... Foi aí que Jacob do Bandolim começou a dedilhar as cordas e o dueto fez todos aplaudirem a história terrena de Jamelão. Tinha muito mais gente na minha divagação, mas o nosso intéprete, amarrou uma liga de borracha entre os dedos da mão esquerda e começou a cantar, contando com um coral de primeira como João Nogueira, Gonzaguinha, Clementina de Jesus...

"... quem me vê sorrindo
pensa que eu estou alegre
o meu sorriso é por consolação
por que sei conter, para ninguém ver
o pranto do meu coração..."

Que a terra fertilizada que Jamelão jaz, dê frutos não só na Mangueira, mas também na Portela, no Império Serrano, na Vila Isabel... e que desta forma o samba resista forte como o homem que nunca se dobrou e apenas aos 95 anos deixou o microfone emudecer, a espera de uma nova semente.