sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

Desejamos, não para o ano novo, mas para a vida inteira: Poesia!

Car@s Amig@s, este poema que se segue é de Pablo Neruda e isto bastaria para lhe publicar. Mas no livro Confesso que Vivi, ele marca com este fragmento, o momento que avaliou como sendo a hora de sair da passividade e fazer de sua poesia, arma. Seu grande amigo Federico Garcia Lorca acabara de morrer vítima do golpe fascista do General Franco, aliado de Hitler e Mussolini que invadiu não só a Espanha, mas também o sonho socialista recém eleito naquele país.

Desejo a tod@s que façam o mesmo. Que girem suas vidas para o outro, para o próximo, para a construção de um mundo justo e fraterno. Que façam de suas poesias (sejam vocês alunos, professores, operários...) armas contra os poderosos, para que um dia, em nossas velhices, possamos levantar a cabeça e, orgulhosos, dizer para os mais novos que valeu a pena. Que venha o ano novo, mais que isto, o futuro novo, a humanidade nova!

 

Chico Baeta

 

 

As máscaras e a Guerra


Minha casa ficou entre os dois setores... De um lado avançavam mouros e italianos... De cá avançavam, retrocediam ou estacavam os defensores de Madri... Pelas paredes tinha entrado a artilharia... As janelas partiram-se em pedacínhos... Encontrei no solo restos de chumbo entre meus livros... Mas minhas máscaras tinham ido embora... Minhas máscaras recolhidas no Sião, em Bali, em Sumatra, no arquipélago Malaio, em Bandoeng... Douradas, cinzentas, cor de tomate, com sobrancelhas prateadas, azuis, diabólicas, ensimesmadas, minhas máscaras eram a única recordação daquele primeiro Oriente a que cheguei solitário e que me recebeu com seu cheiro de chá, de estrume, de ódio, de suor, de jasmins intensos, de frangipán, de fruta podre nas ruas... Aquelas máscaras, recordação das puríssimas danças, dos bailes defronte do templo... Gotas de madeira coloridas pelos mitos, restos daquela mitologia floral que no ar desenhava sonhos, costumes, demônios, mistérios irreconciliáveis com minha natureza americana... E então... Talvez os milicianos tinham assomado às janelas de minha casa com as máscaras postas, assustando assim os mouros, entre um disparo e outro... Muitas delas ficaram estilhaçadas e sangrentas ali mesmo... Outras rolaram do meu sétimo andar, arrancadas por um disparo... Na frente delas tinham se estabelecido as tropas avançadas de Franco... De minha casa, trinta máscaras de deuses da Ásia se elevavam no último bàile, o baile da morte... Era um momento de trégua... As posições tinham mudado... Sentei-me olhando os despojos, as manchas de sangue na esteira... E através das novas janelas, através dos furos da metralha... Olhei para longe, para além da cidade universitária até as planícies e os castelos antigos... A Espanha me pareceu vazia... Pareceu-me que meus últimos convidados já tinham ido embora para sempre... Com máscaras ou sem máscaras, entre os disparos e as canções de guerra, a louca alegria, a incrível defesa, a morte ou a vida, aquilo tinha terminado para mim... Era o último silêncio depois da festa... Depois da última festa... De certa maneira, com as máscaras que se foram, com as máscaras que caíram, com aqueles soldados que eu nunca havia convidado, a Espanha tinha ido embora para mim...

Pablo Neruda


Obs.: Ofereço este poema e tudo que isto significa a tod@s que, neste ano que acaba, mergulharam na poesia de Neruda, Brecht, Vinicius, Chico, Vandré, Eduardo Alves da Costa, Maiakovsky, João Cabral de Mello netto... Vocês são "imprescindíveis".

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